INSS sabia há 6 anos de risco de golpes contra aposentados rurais
Publicado em 06/05/2025 , por Naian Lucas Lopes
Reuniões oficiais registraram alertas de conselheiros sobre falta de proteção a beneficiários do campo já em 2019, segundo atas do CNPS
O INSS( Instituto Nacional do Seguro Social) foi alertado em reuniões oficiais desde 2019 sobre a vulnerabilidade de aposentados e pensionistas rurais diante das transformações nos canais de atendimento da Previdência.
As atas do CNPS( Conselho Nacional de Previdência Social), órgão consultivo que reúne representantes do governo, dos trabalhadores e dos empregadores, registram uma série de advertências feitas por conselheiros sobre os riscos enfrentados por essa parcela da população com a digitalização do atendimento, a redução de agências físicas e a ausência de mecanismos de proteção contra fraudes.
Os registros das reuniões realizadas entre 2019 e 2020 mostram que os alertas foram direcionados diretamente à presidência do INSS no governo Bolsonaro e a gestores do Ministério da Economia, chefiado pelo então ministro Paulo Guedes.
Os conselheiros ressaltaram, em diversas ocasiões, que os segurados rurais tinham dificuldades de acesso aos serviços digitais, não possuíam familiaridade com os sistemas on-line e que estavam sujeitos à desinformação e exploração.
Na reunião de 20 de fevereiro de 2020, o conselheiro Dionízio Martins de Macedo Filho afirmou que um dos principais entraves enfrentados pelos segurados era a lentidão para cumprimento de exigências documentais.
“As exigências e o tempo demandado para o cumprimento delas, prazos que demoram, em média, de 100 dias do envio dos documentos, para informar se ainda existem pendências”, declarou.
Ele também observou que “a falta de atendimento presencial impede que possíveis discrepâncias sejam sanadas no momento do atendimento, como a troca por um benefício mais vantajoso”.
Na mesma ocasião, José Tadeu Peixoto da Costa, representante da Cobap (Confederação Brasileira de Aposentados, Pensionistas e Idosos), relatou casos de demora no atendimento e alertou que o modelo digital não era acessível à maioria dos beneficiários da Previdência.
“O INSS Digital não atende a grande parte dos que necessitam do serviço, visto que a maioria é composta por uma população de baixos recursos e com pouca familiaridade às ferramentas digitais”, disse.
Ele expôs o caso de um segurado que aguardou 120 dias para enviar documentos exigidos e mais 100 dias para que o processo fosse analisado.
Outros conselheiros também se manifestaram. Evandro José Morello alertou que o fechamento de agências no interior do país gerava um impacto direto sobre os mais pobres.
“Manifestou sua preocupação com o número de processos represados e a insatisfação das pessoas que estão na ponta”, consta na ata. Ele acrescentou que “a contratação temporária não é o melhor caminho para resolver o problema de uma instituição tão importante para a sociedade”.
A preocupação com a população rural também foi destacada por Morello. “Informou ainda que a questão do rural se torna mais sensível devido às suas peculiaridades e que por sua vez exige cuidado diferenciado pela diversidade, sobre a situação de cada trabalhador e em como ele pode comprovar o acesso a esse direito”.
Na mesma reunião, o então presidente do INSS, Leonardo Rolim, admitiu que o sistema precisava de aprimoramento, mas justificou que discrepâncias eram esperadas diante da grande escala da demanda.
“É normal que aconteçam algumas discrepâncias”, afirmou, segundo a ata. Rolim também declarou que o INSS estava promovendo treinamentos para melhorar a qualidade das análises e anunciou que áreas de autoatendimento seriam implementadas nas agências.
O conselheiro Ariovaldo de Camargo, da CUT (Central Única dos Trabalhadores), afirmou que os investimentos em tecnologia não haviam resolvido o déficit de pessoal. “As tecnologias não foram suficientes para resolver o desabastecimento de pessoal”, disse.
Na reunião de 2020, o governo Bolsonaro explicou que estava contratando temporariamente servidores aposentados do INSS e militares para diminuir a falta de funcionários e resolver a demanda represada.
Ariovaldo defendeu a realização de concursos públicos para recomposição do quadro funcional, criticando a contratação de militares e aposentados.
Operação Sem Desconto
Esses registros voltaram à tona após a deflagração da Operação Sem Desconto, conduzida pela Polícia Federal em abril de 2025.
A operação revelou um esquema de descontos indevidos em aposentadorias e pensões, realizados por associações e sindicatos com base em ACTs (Acordos de Cooperação Técnica) firmados com o INSS.
Segundo a CGU (Controladoria-Geral da União), entre 2019 e 2024, foram descontados até R$ 6,3 bilhões diretamente dos benefícios de aposentados e pensionistas sem autorização válida.
A investigação identificou que 72% das entidades com ACTs não apresentaram documentação regular e que parte significativa das autorizações de desconto era falsificada ou obtida por indução.
A maioria das vítimas do esquema era composta por beneficiários rurais, idosos, analfabetos e pessoas com doenças graves.
O relatório da CGU aponta que os descontos indevidos totalizaram R$ 1,2 bilhão em 2023 e R$ 2,8 bilhões em 2024. Uma auditoria interna do INSS, concluída em setembro de 2024, havia identificado R$ 45,5 milhões em descontos irregulares apenas entre janeiro de 2023 e maio de 2024.
A Polícia Federal apurou ainda que o INSS ignorou pelo menos seis alertas da CGU entre maio e julho de 2024, que indicavam riscos nas parcerias com associações.
Afastamentos e demissão
Seis servidores públicos foram afastados, entre eles o presidente do INSS à época, Alessandro Stefanutto, que pediu demissão após a operação.
A investigação também identificou o repasse de R$ 17 milhões a ex-servidores de alto escalão por parte de intermediários das entidades suspeitas. Pelo menos 31 entidades estão sob investigação.
A Contag (Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura), que esteve presente em 13 das 15 reuniões do CNPS durante o atual governo, é apontada como a organização que mais reteve recursos.
Os dados divulgados pela CGU e pela PF reforçam os alertas registrados anos antes nas atas do CNPS. Apesar das advertências recorrentes, as fragilidades estruturais identificadas pelos conselheiros seguiram sem solução, especialmente no atendimento à população rural.
Segundo os investigadores, a ausência de mecanismos de verificação e a baixa fiscalização contribuíram para a manutenção dos descontos ilegais ao longo de cinco anos.
Quem sofreu o golpe, vai poder reaver o dinheiro?
Sim, é o que afirma o advogado Devanir Morbi. “O próprio governo federal informou que é prioridade devolver o dinheiro de quem foi vítima do golpe. Já há canais para que as pessoas prejudicadas busquem seus direitos, como o Meu INSS, agências físicas e a Central de Atendimento 135”, explica.
Ele também aponta que essas pessoas foram vítimas de crime de estelionato. “Quem participou do crime, teve vantagem ilícita, induzindo ou mantendo outra pessoa em erro, mediante artifício, ardil ou qualquer outro meio fraudulento e, pelas informações das investigações, as fraudes foram majoritariamente conduzidas por entidades privadas, com apuração focada em descontos sem autorização”, completou.
O caso segue em investigação. A CGU recomenda a revisão dos ACTs firmados desde 2019 e a adoção de controles mais rigorosos para evitar novos prejuízos aos beneficiários da Previdência Social.
O Portal iG entrou em contato com o INSS, mas não houve manifestação até a publicação desta reportagem. Caso o órgão se posicione, a matéria será atualizada.
Fonte: economia.ig - 05/05/2025
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