Fisco apura se Britânia altera dado de produto por imposto
Publicado em 24/09/2019 , por Fábio Fabrini
Inmetro identifica ventilador com potência menor que exigida para isenção de IPI
Uma das maiores indústrias de eletrodomésticos do Brasil, a Britânia é investigada sob suspeita de manipular dados sobre um de seus produtos para se livrar do pagamento de impostos.
Documento da Receita Federal, obtido pela Folha, diz que a empresa declara que a potência de seus ventiladores é diferente da real, o que serviria para enquadrá-los numa faixa com alíquota zero do IPI (Imposto sobre Produto Industrializado).
O tema chamou a atenção do Fisco depois que o Inmetro (Instituto Nacional de Metrologia, Qualidade e Tecnologia) enviou ao órgão o resultado de um teste feito no modelo de mesa Mega Turbo 40 Six.
O exame mostrou que a potência do equipamento era de 96 watts, e não de 130, como declarado na embalagem.
O regulamento do IPI prevê alíquota de 15% para ventiladores de até 125W. Acima disso, não incide o imposto.
Numa nota técnica emitida em julho deste ano, a Coordenadoria-Geral de Informações Tributárias (Cosit) da Receita registra que pode haver “motivação de fundo tributário (redução da alíquota do IPI de 15% para 0%)” para a alteração dos dados.
“Diante desse fato, o ofício do Inmetro foi encaminhado para a Coordenação-Geral de Fiscalização para as providências cabíveis”, afirma a Cosit.
O teste foi feito no ventilador da Britânia depois que o Inmetro recebeu uma denúncia do ex-deputado federal Alexandre Valle (PL-RJ).
Num ofício de junho de 2017, ele pede que o órgão verifique possível adulteração das potências informadas nas embalagens da Britânia e de uma outra marca, o que para ele, se confirmado, poderia trazer riscos à segurança de consumidores. “Outro fator agravante da prática delituosa aqui relatada é o recolhimento a menor do IPI”, argumentou.
Procurado pela Folha, o ex-congressista disse que enviou a representação a pedido de um grupo de universitários que testara os produtos.
O Inmetro abriu fiscalização e submeteu os ventiladores das duas marcas a ensaios num laboratório credenciado. O resultado comprovou a suspeita no caso da Britânia.
O Inmetro informou ao ex-deputado que, sob a ótica de seu regulamento, não é uma irregularidade subestimar a potência de um ventilador, pois isso não afeta a segurança e a saúde do consumidor. Também não haveria, segundo o órgão, impacto na eficiência energética do bem.
Caso a potência fosse mais de 20% além da declarada, aí, sim, haveria problema.
O caso foi arquivado no Inmetro, mas o então presidente do órgão, Carlos Augusto de Azevedo, remeteu à Receita um relato sobre o teste em julho do ano passado.
“Oficiamos objetivando implementar as medidas cabíveis no que tange à regularização com observância ao regulamento do IPI, por se tratar de prática de concorrência desleal”, justificou, em ofício.
A Receita não informou se iniciou fiscalização, alegando respeito ao sigilo fiscal.
Responsável por atestar a qualidade e a segurança de produtos à venda no mercado, o Inmetro tropeça em possíveis irregularidades fiscais de empresas com frequência.
Em 2017, por exemplo, o órgão enviou ao Fisco ao menos sete casos de companhias que estariam declarando importar bens a valores menores que os reais, supostamente para pagar menos tributos.
Procurada pela Folha, a Britânia afirmou, em nota, que todos os seus produtos são testados e certificados conforme as normas do Inmetro e que os certificados estão disponíveis no site da instituição.
“Caso algum produto tenha sido encontrado fora das especificações contidas nos certificados, acreditamos ser algum defeito de fabricação. Vamos solicitar uma verificação do estoque do produto, a fim de analisarmos algum problema desconhecido”, declarou, em nota, acrescentando estar disposta a prestar “qualquer esclarecimento necessário” sobre o caso.
A empresa disse ainda que 95% de seus ventiladores “têm potência inferior a 125W, com cobrança de 15% de IPI. A atual gestão do Inmetro criticou o ex-presidente Carlos Augusto de Azevedo por enviar denúncia à Receita e informou que abrirá sindicância.
“A interpretação dada pelo então presidente do Inmetro não se baseou na argumentação e na regulamentação técnica, que prevê que, nos casos de segurança auditiva, são consideradas irregulares potências sonoras 20% superiores ao declarado. No caso em questão, a potência sonora encontrada é inferior ao declarado e estava, portanto, de acordo com a regulamentação [do Inmetro]”, justificou.
À Folha Azevedo afirmou que todas as suas manifestações se basearam em pareceres da consultoria jurídica do Inmetro. “Essa questão de você lavar as mãos é muito complicada. Se encontro alguma coisa anormal, encaminho a quem de direito.”
Fonte: Folha Online - 23/09/2019
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