Um panorama sobre a teoria aprofundada do desvio produtivo do consumidor
Publicado em 12/07/2019 , por Marcos Dessaune
É notório que inúmeros fornecedores, cotidianamente, empregam práticas abusivas e colocam produtos e serviços com vício ou defeito no mercado de consumo. Além disso, muitos desses fornecedores, diante da reclamação do consumidor, ainda resistem à rápida e efetiva resolução desses problemas de consumo que eles próprios criam. Tal comportamento induz o consumidor em estado de carência e condição de vulnerabilidade a despender seu tempo vital, a adiar ou suprimir algumas de suas atividades existenciais e a desviar suas competências dessas atividades, seja para satisfazer certa carência, seja para evitar um prejuízo, seja para reparar algum dano.
Tal série de condutas caracteriza o “desvio produtivo do consumidor”, que é o evento danoso que acarreta lesão ao tempo existencial e à vida digna da pessoa consumidora, que sofre necessariamente um dano extrapatrimonial de natureza existencial, que é indenizável in re ipsa. Consequentemente este artigo conclui que está equivocada a jurisprudência tradicional que sustenta que a via crucis percorrida pelo consumidor, ao enfrentar problemas de consumo criados pelos próprios fornecedores, representa “mero aborrecimento”.
1. Evolução socioeconômica, descrição fenomenológica e suporte jurídico do desvio produtivo do consumidor
Na luta por sobrevivência e bem-estar, a humanidade levou 10 mil anos para evoluir do modo de produção primitivo para o capitalista. O progresso tecnológico, econômico e organizacional havido nesse período transformou bandos de indivíduos nômades e autossuficientes, que viviam submissos às forças do impulso e do hábito, numa sociedade altamente especializada, interdependente e relativamente desenvolvida em termos materiais. Essa transformação do modo de produção da sociedade foi o resultado da divisão do trabalho e do desenvolvimento do sistema de trocas, entre vários outros fatores evolutivos que, combinados, levaram ao expressivo aumento da produtividade que gerou grandes excedentes e, assim, permitiu que as pessoas pudessem trocá-los pelos demais bens e serviços de que necessitavam.
Desde então as pessoas passaram a ter a possibilidade de viver com mais liberdade e qualidade de vida, uma vez que a sociedade pós-industrial, apesar dos aspectos negativos inerentes ao sistema capitalista, proporciona a seus membros um poder liberador: o consumo de um produto ou serviço de qualidade, produzido por um fornecedor especializado na atividade, tem a utilidade subjacente de tornar disponíveis o tempo e as competências que o consumidor necessitaria para produzi-lo para seu próprio uso. Ou seja, o fornecimento de um produto ou serviço de qualidade ao consumidor tem o poder de liberar os recursos produtivos que ele utilizaria para produzi-lo para uso próprio.
Numa visão teleológica significa dizer que, nas relações de consumo em que a sociedade contemporânea se apoia, todo fornecedor tem a grande missão implícita de liberar os recursos produtivos do consumidor — fornecendo produtos e serviços de qualidade que deem ao consumidor condições de empregar o seu tempo e as suas competências nas atividades de sua livre escolha e preferência, que geralmente são atividades existenciais.
Juridicamente essa missão do fornecedor está fundada nos seus deveres legais de colocar, no mercado de consumo, produtos e serviços que tenham padrões adequados de qualidade-adequação e qualidade-segurança; de dar informações claras e adequadas sobre seus produtos e serviços; de agir sempre com boa-fé; de não empregar práticas abusivas no mercado; de não gerar riscos ou causar danos ao consumidor; de sanar os vícios que seus produtos e serviços apresentem e de reparar os danos que eles e eventuais práticas abusivas causem ao consumidor, de modo espontâneo, rápido e efetivo.
Acrescente-se que a realização dessa missão basilar do fornecedor — que materializa o poder liberador da sociedade pós-industrial — está condicionada ao fato de que a interdependência que caracteriza e orienta a sociedade, resultante da especialização das pessoas que a compõem, seja vivida por cada uma com consciência, efetividade, equidade e responsabilidade.
Ocorre que inúmeros profissionais autônomos e liberais, empresas de diversos portes e o próprio Estado, em vez de atender o consumidor com qualidade — assim satisfazendo as suas necessidades, desejos e expectativas, promovendo o seu bem-estar, contribuindo para a sua existência digna e liberando os seus recursos produtivos —, corriqueiramente não realizam sua missão, por despreparo, desatenção, descaso e/ou má-fé. Dito de outra maneira, incontáveis fornecedores, no lugar de cumprir os seus principais deveres jurídicos originários — de qualidade-adequação, de qualidade-segurança, de informação, de boa-fé, de não empregar práticas abusivas no mercado, de indenidade —, cotidianamente violam a lei, por ato culposo ou doloso.
Assim procedendo, tais fornecedores permitem ou contribuem para que se criem problemas de consumo representados pelo fornecimento de produtos ou serviços com vício ou defeito, ou pelo emprego de práticas abusivas no mercado. Trata-se de atos antijurídicos potencial ou efetivamente danosos ao consumidor, que frustram as legítimas expectativas e a confiança dele e ensejam o dever jurídico sucessivo do fornecedor de sanar o problema ou indenizar o consumidor espontânea, rápida e efetivamente.
Clique aqui para ler o artigo completo na revista Direito em Movimento da Emerj (a partir da página 15).
Fonte: Conjur - Consultor Jurídico - 11/07/2019
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