Carlos Ghosn, presidente do conselho da Nissan, é preso no Japão e deverá ser destituído
Publicado em 20/11/2018 , por Lucas Neves
Executivo nascido no Brasil é investigado por supostas violações financeiras
O presidente do conselho de administração da Nissan, Carlos Ghosn, foi preso nesta segunda-feira (19), por supostas violações financeiras no Japão.
Admirado por salvar a montadora japonesa da falência, Ghosn também é executivo-chefe da aliança Renault-Nissan-Mitsubishi.
Ele é suspeito de sonegação, ao declarar às autoridades uma renda inferior à real.
O presidente-executivo da Nissan, Hiroto Saikawa, irá propôr ao conselho de administração da empresa a remoção de Ghosn, em reunião que está marcada para esta quinta-feira (22).
A companhia confirmou que Ghosn ocultou sua renda do fisco "durante anos". "Além disso, várias outras práticas ilícitas foram descobertas, como o uso de bens da empresa com fins pessoais", afirmou a empresa.
Ele e outro diretor da empresa, Greg Kelly, são alvo de uma investigação interna há meses, segundo nota divulgada pela Nissan, que informa que já está em colaboração com os procuradores.
Representantes de Ghosn não foram localizados para comentar.
O presidente francês, Emmanuel Macron, afirmou que vai trabalhar para preservar a estabilidade da aliança entre Renault e Nissan e que ainda era cedo para comentar as acusações.
"Como um acionista, o governo francês vai continuar extremamente vigilante quanto à estabilidaqde da aliança", afirmou. O governo detém 15% do capital da Renault.
Segundo a mídia local japonesa, Ghosn teria declarado uma renda 38 milhões de euros menor do que a real. A prática teria começado em 2011 e teria durado mais de cinco anos.
O salário do executivo é objeto de controvérsia há alguns anos. Ele chegou a ganhar mais de 15 milhões de euros pelo acúmulo de funções na Nissan e na Renault, mas o valor diminuiu em 2017, quando Ghosn deixou de ser o executivo-chefe da montadora japonesa.
Em junho passado, ao ser reconduzido ao posto de número 1 da empresa francesa, ele aceitou um corte de 30% em seu salário –uma demanda de acionistas– e a nomeação de um número 2, Thierry Bolloré.
As ações da Renault em Paris despencaram nas Bolsas da Europa na tarde desta segunda, após a notícia da prisão. Os papeis da Renault chegaram a cair 13% em Paris, enquanto os da Nissan registraram baixa de 12% na Alemanha.
A Bolsa japonesa já estava fechada quando a notícia foi divulgada.
O cortador de gastos
Nascido no Brasil, descendente de libaneses e cidadão francês, Ghosn, 64, iniciou sua carreira na Michelin na França, onde trabalhou por 16 anos, e se transferiu para a Renault.
Ele chegou a Tóquio em 1999 para recolocar a Nissan nos trilhos, no momento em que a empresa acabava de se unir à francesa Renault. Ele foi nomeado presidente-executivo dois anos depois.
Com cerca de US$ 20 bilhões em dívidas, a Nissan precisou de um tratamento de choque na época. Houve demissões, encerramento de parcerias e fechamento de linhas de produção pouco produtivas.
Apelidado de "cost killer" ("cortador de gastos"), ele transformou um grupo à beira da falência em uma empresa lucrativa com volume anual de negócios da ordem de quase 100 bilhões de euros. Isso lhe valeu grande admiração no Japão.
Após o plano de recuperação, a companhia registrou lucros recordes.
Em 2005, o executivo passou a presidir também a Renault, sendo a primeira pessoa a liderar duas montadoras simultaneamente.
Em 2008, Ghosn passou a acumular também a liderança do conselho de administração da Nissan.
Em abril de 2017, passou o bastão para seu herdeiro, Hiroto Saikawa, ainda permanecendo à frente do conselho de administração. Passou a se concentrar mais na aliança da Renault com a Mitsubishi Motors, que ele levou para o topo da indústria automobilística mundial.
No mesmo ano, a empresa havia investido na Mitsubishi, após a companhia ser afetada por escândalo sobre falsificação de dados sobre emissão de poluentes.
A parceria Renault-Nissan-Mitsubishi é, hoje, uma construção de equilíbrios complexos, constituída de distintas empresas ligadas por participações cruzadas não majoritárias.
A Renault detém 43% da Nissan, que possui 15% do grupo do diamante, enquanto a Nissan possui 34% de seu compatriota Mitsubishi Motors. Rumores de fusão vazaram recentemente.
As acusações contra Carlos Ghosn, que construiu essa aliança sozinho, acumulando funções como nenhum outro executivo desse nível até então, são um duro golpe no trio franco-japonês que reivindica o título de primeiro conglomerado automobilístico mundial.
No ano passado, foram 10,6 milhões de carros vendidos, superando os concorrentes Toyota, ou Volkswagen.
Veja a nota divulgada pela Nissan na íntegra
Quanto a graves delitos de conduta pelo presidente do conselho da Nissan e um diretor representante
Yokohama, Japão
Com base nas acusações de um denunciante, a Nissan Motor vem conduzindo uma investigação interna há alguns meses sobre delitos de conduta por parte de Carlos Ghosn, seu diretor representante e presidente de seu conselho, e Greg Kelly, diretor representante.
A investigação demonstrou que, há muitos anos, tanto Ghosn quanto Kelly vêm reportando remunerações recebidas em forma de títulos negociados na Bolsa de Valores de Tóquio por um valor inferior ao efetivo, a fim de reduzir o valor da remuneração declarada publicamente por Carlos Ghosn.
Além disso, com relação a Ghosn também existem diversos outros delitos de conduta, como uso pessoal de ativos da empresa; o envolvimento profundo de Kelly com os delitos também foi confirmado.
A Nissan vem fornecendo informações à procuradoria pública japonesa e coopera plenamente com sua investigação. Continuaremos a fazê-lo.
Já que os delitos de conduta revelados pela investigação interna constituem clara violação de seus deveres como membros do conselho, Hiroto Saikawa, o presidente-executivo da Nissan, proporá ao conselho da empresa que Ghosn seja removido imediatamente de seus postos como presidente do conselho e diretor representante. Saikawa proporá também que Kelly seja removido de seu posto como diretor representante.
A Nissan pede profundas desculpas por causar grande preocupação aos nossos acionistas e aos interessados na empresa. Continuaremos nosso trabalho para identificar nossas questões de governança e fiscalização, e tomaremos as medidas apropriadas.
Fonte: Folha Online - 19/11/2018
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