Penhor bate recorde; adeptos contam o melhor e o pior deste empréstimo
Publicado em 03/08/2017
O aperto financeiro somado à facilidade de crédito e juros baixos fizeram com que o penhor da Caixa registrasse um recorde no primeiro semestre de 2017. Foram R$ 7,2 bilhões em novos contratos e renovações, aumento de 11,3% em relação o mesmo período de 2016. A seguir, adeptos desse tipo de empréstimo contam por que escolheram o penhor, suas principais vantagens e desvantagens. No final, há também uma explicação sobre como funciona este tipo de empréstimo.
Durante muitos anos, Sebastiana dos Santos, 61, foi vendedora de joias: assim pagou a faculdade da filha, comprou carros e imóveis. Hoje os objetos ainda lhe geram renda, mas de outra forma: com o penhor. "Fui vítima de uma estelionatária e perdi meu catálogo com o equivalente a R$ 68 mil. As joias que ainda tenho foram todas empenhadas", contou à reportagem enquanto aguardava para ser atendida em uma agência da Caixa em São Paulo.
Santos, que hoje trabalha como cabeleireira e manicure em domicílio, diz que todas as suas joias foram avaliadas pela Caixa em R$ 10 mil. Uma única pulseira garantiu um empréstimo de R$ 1.000, mas os outros itens renderam cerca R$ 300 cada um (pelo anel recusado, ela esperava R$ 200).
O problema é quando não há dinheiro para pagar o empréstimo –nestes casos, o atraso gera mais juros e os bens podem ir a leilão. Já perdeu assim duas alianças, sendo uma das bodas de ouro de sua mãe. "Consegui R$ 340 por ela no penhor. Com este dinheiro eu não compraria algo parecido, fora o valor sentimental. Pela outra que perdi eu consegui uns R$ 300, mas valeria uns R$ 4.000. Fiquei muito chateada", lamenta.
No dia da entrevista, ela tinha uma parcela do penhor vencida, poucos dias para fazer este pagamento atrasado e uma certeza, que aprendeu na prática: "Se não pagar, perde".
DINHEIRO IMEDIATO
A decoradora Flávia*, 39, cita como principal vantagem do penhor o "dinheiro imediato", que vem logo após a avaliação da joia. Atualmente, ela tem na Caixa um único anel dourado avaliado em R$ 20 mil, pelo qual recebeu empréstimo de R$ 8.000.
"A cotação do ouro estava boa e ele é maciço, bem grandão. Acho que era meu dia de sorte", brinca.
Já chegou a levar um anel que comprou por R$ 60 mil, pelo qual receberia R$ 800 no empréstimo –diante de tanta diferença, recusou a oferta. "A peça é cheia de brilhantes, mas só levam em conta o ouro. Nesses casos não vale a pena, compensa mais vender", afirma ela, que tenta equilibrar as contas após a falência da empresa que tinha com o ex-marido. O maior problema da venda, aponta, é o valor afetivo.
Ela teve esta mesma sensação ao esquecer de pagar um boleto, quando uma joia de sua mãe –um anel solitário presenteado pelo pai, já morto– foi a leilão. "Fiquei mal, ela ficou muito chateada e não tem como ressarcir porque existe um valor sentimental. Ainda tentei ir atrás no leilão, mas não encontrei a joia."
Para evitar que o mesmo aconteça com seu anel de ouro, ela agora paga as parcelas antes do vencimento. "Não deixo atrasar, não corro este risco. Mesmo que eu demore para resgatar, sei que ele está bem guardado, em segurança."
VALOR BAIXO
Em tempos de crise, o motivo que levou o comerciante Valmir Figueiredo, 67, a empenhar foge da convencional busca por dinheiro. "Entraram na casa de um vizinho e levaram suas joias. Decidi empenhar por segurança, para não ficar com esses itens expostos", explica Figueiredo, que teve seus bens avaliados em cerca de R$ 2.500. "Não é muito, mas temos de dar valor ao que é nosso."
A prática começou há cerca de dois anos e, desde então, ele renova os contratos sempre que chegam ao fim. O dinheiro obtido com o penhor também fica guardado –no dia da entrevista, em uma agência de São Paulo, ele disse não se lembrar do montante obtido com o penhor.
As peças são de ouro, metal apreciado pelo comerciante e também por sua mulher. Apesar disso, seu uso no dia a dia está descartado: "Não quero me desfazer delas pelo valor afetivo, mas é arriscado usá-las. Se alguém as levasse, além do risco da agressão, será que eu conseguiria repor essas peças?".
Duas coisas impressionaram a publicitária Marina*, 43, que recentemente empenhou pela primeira vez as joias presenteadas.
A primeira foi a quantidade de pessoas buscando esse serviço: "Fiquei abismada. Encontrei até o marido de uma amiga, que ficou superconstrangido". A segunda, o valor que obteve com o penhor: "Pagam muito pouco. Mas não quis vender pelo envolvimento emocional, pelas histórias envolvendo aquelas peças e acreditando que a situação vai melhorar".
Desempregada desde o início do ano, Marina diz que os cinco anéis e uma corrente empenhados totalizam R$ 30 mil. Os itens renderam R$ 2.400 de empréstimo, segundo Marina, porque o valor de algumas peças está nas pedras e não no ouro. "Um anel com 86 brilhantes vale cerca de R$ 15 mil, mas rendeu R$ 500. O que consegui com tudo não paga nem um dos anéis. Mas o dinheiro veio na mesma hora e sei que vou recuperar tudo."
COMO FUNCIONA O PENHOR?
O cliente deve procurar uma das 466 agências da Caixa que realizam esse serviço em todo o Brasil. É preciso levar RG, CPF, comprovante de residência e os bens que pretende empenhar –são aceitos joias, diamantes, relógios, canetas e prataria. Os itens são deixados em poder da instituição como garantia do empréstimo e podem ser resgatados ao final do pagamento.
A Caixa usa como índice-padrão R$ 76 pelo grama do ouro. Este valor pode variar muito, conforme a qualidade e o tipo de cada joia.
Após avaliação, o dinheiro é entregue na hora sem análise de crédito nem exigência de avalista. Atualmente, os juros são de 2,1% ao mês. O valor do empréstimo chega a 85% do valor da garantia (ou até 100% para clientes com conta salário no banco). O pagamento pode ser feito em parcela única, no período de até 180 dias, ou em até 60 meses. Sempre que o contrato termina, é possível renová-lo.
Caso o cliente não pague as parcelas, os juros ficam mais altos. Depois de 30 dias de atraso, o cliente é notificado para regularizar seu contrato. Se isso não acontecer, ele perde seus bens empenhados, oferecidos no próximo leilão.
Os nomes foram trocados para preservar a identidade das entrevistadas.
Fonte: Folha Online - 02/08/2017
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