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Por que tanta corrupção em uns lugares e tão pouca em outros?
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Por que tanta corrupção em uns lugares e tão pouca em outros?

Publicado em 19/05/2017

Difícil pensar que a quantidade de pessoas com gene da corrupção varie muito entre países. Somos todos Sapiens. Mas, ainda assim, a corrupção varia enormemente de um lugar para outro.

E não precisa comparar o Brasil com países nórdicos não, mesmo países semelhantes em diversas dimensões podem apresentar níveis de corrupção muito distintos. Argentina e Uruguai são um belo par: mesma origem, mesma geografia, mesma língua, renda por habitante similar e... Níveis de corrupção superdiferentes. No ranking da Transparência Internacional, o Uruguai aparece em 21º lugar e a Argentina em 100º!

Há um componente forte de crenças adversas que se reforçam em sociedades muito corruptas. No jargão, o equilíbrio com alta corrupção é um equilíbrio de Nash. Vejamos o porquê.

Pense em pais que se preocupam muito com a educação dos filhos vivendo num país corrupto, onde para frequentar boas escolas a condição necessária é molhar bem a mão do diretor. Nessas circunstâncias, pessoas que condenam moralmente atos corruptos vão praticá-los, porque não agir de modo corrupto prejudica demais a vida dos seus filhos. Se todo mundo dá propina, a escolha ótima para você é dar propina também, mesmo que isso incomode sua consciência.

O mesmo vale para um político que pratica caixa dois. Imagine que o cara esteja pensando em agir honestamente. Sabe o que acontece? Ele perde com quase 100% de certeza, porque se todos os outros fazem campanhas regadas a dinheiro, fica difícil competir. E uma empresa, digamos uma construtora num país corrupto? Se ela sabe que seus concorrentes pagam propina para ganhar uma obra, só tem duas opções: fechar ou pagar propina também.

Agir de modo corrupto num mundo corrupto é quase uma necessidade. Mais ainda, com todo mundo agindo assim, a chance de ser pego é pequena. E quem delata pode se dar muito mal...

Agora vamos sacudir esse equilíbrio com um juiz faixa-preta que manda prender um monte de salafrários, e uma Polícia Federal fazendo devassas sem dó. O custo de agir de modo ilícito cresce muito. Se muita gente passa a ter medo concreto de praticar caixa dois, minhas crenças se alteram: eu, candidato, passo a pensar que o outro não faz mais caixa dois, por medo.

Desse modo, se eu não praticar caixa dois não serei prejudicado nas eleições. E o outro candidato entende que eu penso desse modo, e assim ele também abandona o caixa dois!

O mesmo para uma empresa de construção. Depois da prisão de Marcelo Odebrecht, quem vai ter coragem de se envolver em propinodutos? Creio que ninguém. Mas sendo assim, não preciso me preocupar em oferecer propina (dado o novo comportamento esperado para os outros), e sim em ter um preço competitivo. E a moçada antecipa que eu penso dessa forma e, consequentemente, age do mesmo modo.

Vai ter gente tentando corromper e gente querendo ser corrompida ainda? Vai, claro, mas aí pegá-los será muito mais fácil, porque os muitos que agora não participam da safadeza têm interesse total em que esses sejam presos.

Enfim, uma chacoalhada forte e crível no sistema pode catapultar a sociedade para outro equilíbrio, no qual a corrupção é pouca e esporádica.

É isso que vai acontecer com o Brasil? Difícil saber, mas agora temos uma chance.

Fonte: Folha Online - 18/05/2017

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