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Crise econômica provoca aumento do número de dependentes de álcool
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Crise econômica provoca aumento do número de dependentes de álcool

Publicado em 23/08/2016 , por LUCILENE OLIVEIRA

A alta taxa de desemprego aliada aos graves problemas financeiros causados pela crise econômica do país são combinações perigosas, que têm levado cada vez mais pessoas à dependência do álcool. A situação é ainda mais crítica entre pessoas que tenham alguma doença associada, como depressão ou quadros de ansiedade, alertam especialistas.

Levantamento feito a pedido da reportagem pela Secretaria Municipal da Saúde, sob a gestão Fernando Haddad (PT), mostra que, no ano passado, o número de pessoas que procurou ajuda nos Caps AD (Centros de Atenção Psicossocial Álcool e Drogas) aumentou 7%. A média diária de atendimento neste ano já é quase o dobro do que a do ano passado. Enquanto em 2015, cerca de 13 pessoas eram atendidas por dia nos Caps, até junho deste ano o número chegou a 25 pacientes diariamente.

O AA (Alcoólicos Anônimos) também disse ter verificado aumento no número de dependentes que buscaram ajuda nos grupos de apoio. As pessoas que dão prosseguimento ao tratamento, no entanto, continua o mesmo, em torno de 5%. "A perda de um emprego pode desencadear [o alcoolismo] de alguém que tenha algo associado, como uma depressão e a crise de ansiedade que não é tratada", explicou Liamar Ferreira, psiquiatra da equipe de Saúde Mental da Secretaria Municipal da Saúde.

SEM SAÍDA

A taxa de desemprego do país do último trimestre é de 11,2%, o equivalente a 11,4 milhões de pessoas. É a maior taxa da série histórica do IBGE, iniciada em 2012.

Foi justamente a conta bancária no vermelho que levou o empresário J.B., 52 anos, a se entregar à bebida há cerca de 18 anos, período em que resolveu buscar ajuda no AA (Alcoólicos Anônimos).

"Eu não via saída e bebia para me livrar daquilo que não tinha como resolver", disse J.B. Por ser regra do AA, a sua identidade não pode ser divulgada. "Eu só fui buscar ajuda após sofrer dois graves acidentes de carro", conta.



 

′SEMPRE ESTAREI EM TRATAMENTO′

A primeira internação para dependentes químicos do professor V.C.S., 42 anos, ocorreu quando ele ainda tinha 36 anos e diante do risco de perder o emprego decidiu pedir ajuda na empresa em que trabalhava. "Apesar de ficar um mês internado na clínica sem colocar uma gota de álcool na boca, a primeira coisa que eu fiz quando saí foi beber e voltar à rotina de antes. Eu fui convidado a sair da empresa", disse.

Com a perda do emprego e o agravamento da doença, o professor se entregou ainda mais à bebida. A luz no fim do túnel só veio depois de voltar para a casa dos pais, já sem condições financeiras de se manter sozinho. "A minha mãe disse que eu teria que buscar tratamento. Só assim ela me ajudaria. Foi quando eu procurei o AA", disse o professor, que está há 1 ano e 4 meses em tratamento.

"O alcoolismo é uma doença da qual eu sempre estarei em tratamento. Se eu parar de frequentar as reuniões hoje, pode ser que amanhã eu já esteja na mesma situação em que eu estava há dois anos", disse.

FAMILIARES DEVEM BUSCAR AJUDA

Para cada alcoólatra, estima-se que outras quatro pessoas (parentes ou amigos) próximas sejam atingidas diretamente. É por isso que os familiares também devem buscar ajuda. O Al-Anon, braço do AA (Alcoólicos Anônimos) destinado a parentes de alcoólatras, também consiste em um tratamento de 12 passos para que a pessoa possa se livrar do trauma e auxiliar o dependente a se livrar do vício em bebida. "Eu fui buscar ajuda antes do meu marido. Só dois anos depois de eu começar a participar das reuniões é que ele se deu conta de que precisava de ajuda", disse a aposentada C.D., 69 anos.

Ela diz que o principal ponto desenvolvido no trabalho do grupo é a tolerância com os dependentes. "Antes de entrar para o grupo, ele chegava em casa e a gente só brigava. Foi a minha mudança de comportamento que o transformou", disse a idosa.

Há dez anos o seu marido faz tratamento no AA e ela continua frequentando os grupos de apoio.



 

POR SER MAIS BARATA, PINGA VIRA OPÇÃO

O diretor do Proad (Programa de Orientação e Atendimento a Dependentes) da Unifesp, Dartiu Xavier da Silveira, explica que uma das principais dificuldades para o combate ao alcoolismo é o fácil acesso à bebida. "É um vício muito tolerado pela sociedade, por isso é difícil que as pessoas reconheçam que estão doentes", disse.

Além do fácil acesso, o baixo custo da cachaça é um outro ponto que pode incentivar o uso. "Em qualquer esquina a pessoa pode comprar uma dose de cachaça com trocados", afirma Liamar Ferreira, psiquiatra da equipe de Saúde Mental da Secretaria Municipal da Saúde. Um exemplo dado pelos profissionais é a cachaça conhecida como "barrigudinha" —meio litro custa cerca de R$ 5 e seu teor alcoólico é muito alto.

Pesquisa da Ibope Inteligência, com base em dados da Confederação Nacional da Indústria, mostra que quando a expectativa do consumidor em relação a situação econômica do país cai, aumenta o número de venda de garrafas de cachaça.

O psiquiatra Hewdy Lobo Ribeiro, diretor clínico do hospital Lacan, alerta para outro fenômeno neste momento de crise. "É muito comum as pessoas substituírem bebidas caras por opções mais baratas. Essa mudança faz com que a pessoa passe a ingerir uma quantidade de álcool ainda maior."

Fonte: Folha Online - 22/08/2016

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